segunda-feira, 12 de junho de 2017

Guia compreensivo para o estudante: 10º ano, Ensino Regular - Aula ε

Valores

 Os valores são expressos através de juízos (A é B).
 É importante que se estabeleça a diferença entre juízos de facto e juízos de valor. Os juízos de facto são puramente descritivos, ou seja, seguem a fórmula A é B. Podem ou não coincidir com a realidade, ou seja, podem ser verdadeiros ou falsos. Tomemos com exemplo o seguinte juízo de facto:
  • O Boavista ganhou o campeonato pela última vez em 2000/2001.
 Este juízo de facto é, de facto, verdadeiro, mas não é isto que faz dele um juízo de facto. Igualmente, um juízo de facto pode ser falso e continuar a tratar-se de tal.
  • O Boavista ganhou o campeonato pela última vez em 2015/2016.
 O precedente juízo continua a ser um juízo de facto.

 Um juízo de valor é um juízo que atribui a algo um valor, quer seja positivo ou negativo, ético, estético, etc.
 Por exemplo:
  • Guernica é um quadro mais bonito que a Mona Lisa.
Guernica, Pablo Picasso
 Este juízo trata-se de um juízo de valor, pois trata-se da atribuição de um valor (ser um quadro mais bonito que a Mona Lisa) a algo (Guernica).

 Porém, podem-se exprimir valorações e preferências através de juízos de facto. Isto ocorre quando exprimimos um gosto, uma preferência, etc., na primeira pessoa. Por exemplo:
  • O meu quadro preferido é o Guernica.
 Aqui temos expresso um juízo de facto, pois estamos a exprimir uma preferência pessoal sobre determinado assunto (Guernica, neste caso), apesar de estarmos a atribuir valores estéticos.
 É convenção nestes casos assumir que a pessoa que faz o juízo está a dizer a verdade, visto que exprime juízos de facto sobre si mesmo.
 Existe também uma correlação entre os juízos de facto e os juízos de valor devido a esta aparente "irregularidade": Se alguém disser o juízo de facto "Penso que Sócrates agiu bem.", e tomar este juízo como verdadeiro, é implícito e obrigatório que aceite o juízo de valor "A ação de Sócrates foi boa." como verdadeiro.

Subjetivismo e objetivismo

 O subjetivismo defende que os valores de juízo são equivalentes a proposições de aprovação e desaprovação. Ou seja, defende que os juízos de valor e os juízos de facto são duas "entidades" distintas.
 Juntamente com o subjetivismo vêm associadas duas outras crenças: a relatividade e a historicidade.
 A relatividade defende que os valores são relativos a cada Homem, ou seja, para mim a escravatura pode não ser moralmente correcta, mas para o João pode ser.
 A historicidade defende que os valores vão mudando ao longo do percurso da História. Por exemplo, a escravatura era uma prática extremamente comum nos tempos de Sócrates, e era aprovada. Porém, actualmente, é extremamente reprovada pela maioria dos indivíduos.

 O objetivismo defende que os valores existem per si, ou seja, que os valores são algo completamente assente, e que são independentes do conhecimento humano. Defende assim que os juízos de facto e de valor não se distinguem verdadeiramente, pois os valores são, para os objetivistas, um facto do mundo, e um juízo de valor não passa de uma tentativa de descrever isso.
 Associados ao objetivismo vêm duas crenças, que se opõem às outras duas defendidas pelos subjetivistas: a absolutidade e a perenidade.
 A absolutidade defende que os valores são algo absoluto, e que não podem sofrer alterações.
 A perenidade defende que os valores são intemporais, e, por isso, não acompanham a História.
 Resumindo:


Posições filosóficas

 No 10ºano estudarás quatro posições filosóficas diferentes relativamente ao subjetivismo e o objetivismo; duas delas defendem o subjetivismo, e as outras duas o objetivismo.
 Vejamos:
  • Psicologismo e Emotivismo: Defendem o subjetivismo, devido ao facto de defenderem que os nossos sentimentos e opiniões pessoais definem os valores.
  • Naturalismo: Defende que os valores são uma qualidade intrínseca aos objetos. Ou seja, um livro é belo porque possui o valor de ser belo em si mesmo. Qualquer outra opinião está errada, pois este valor é objetivo e intrínseco ao livro. Defende, por isso, o objetivismo.
  • Ontologismo: Defende que os valores são ideias, ou seja, a expressão da racionalidade humana. Logo, são ideias que exprimem conceitos imateriais, e também inalteráveis e imutáveis. A defesa do objetivismo é diferente da defesa dos naturalistas pois os defensores do ontologismo afirmam que é a razão universal, algo comum a todos, que define e confere a objetividade. 
  Iremos agora distinguir o psicologismo do emotivismo:
  • Psicologismo: Os valores exprimem a natureza psico-comportamental do sujeito.
  • Emotivismo: Os valores exprimem as emoções e/ou sentimentos do sujeito.

 

Questões de primeira e segunda ordem

 Tomemos como exemplo a disciplina filosófica da estética, e o seguinte quadro:
At Eternity's Gate, Van Gogh
  • Questão de primeira ordem: Uma questão de primeira ordem é aquela que discute a preferência dos indivíduos A e B sobre o quadro, ou seja, é de primeira ordem a questão que coloca em cima da mesa juízos de valor (e.g. A: Gosto deste quadro, pois é belo. B: Não gosto deste quadro, pois não é belo.).
  • Questão de segunda ordem: Um questão é de segunda ordem se a questão colocada for sobre a natureza dos valores em si, e a sua objetividade/subjetividade. Neste caso, entramos no campo da metaestética (e.g. C: Será que este quadro possui intrinsecamente a propriedade de ser belo?).
 Com esta informação, podemos chegar à conclusão de que o subjetivismo e o objetivismo são ambos teorias de segunda ordem.

Argumentos a favor do subjetivismo

  1. Argumento da diversidade: Neste argumento defende-se que, simplesmente, os juízos de valor são extremamente diferentes de pessoa para pessoa (ou cultura para cultura).
  2. Argumento da estranheza de valores: Este argumento constata que, por exemplo, tal como para existir um copo têm que existir átomos, para que uma ação fosse objetivamente boa ou má (no caso da ética), os valores teriam de existir autonomamente e estarem presentes na ação. Tal parece-nos extremamente estranho, e como não temos indícios que tal exista, temos de aceitar o subjetivismo.
  3. Argumento da tolerância: Este argumento aplica-se à ética. Se estamos em dúvida se os valores são objetivos ou subjetivos, temos o dever de escolher a opção que cause menos confrontos entre diferentes culturas ou indivíduos, ou seja, o subjetivismo. 

Objeções a estes argumentos

  1. Um objetivista pode simplesmente constatar que a diversidade e divergência não são suficientes para negar que existe uma verdade absoluta. Lá porque existem pessoas que negam a existência de Deus e outras pessoas que afirmam a Sua existência não quer dizer que ambas as constatações estejam correctas, ou que Deus de facto não exista. Podemos apenas ainda não o saber.
  2. O objetivista pode argumentar da mesma maneira como argumentou no ponto 1: podemos simplesmente (ainda) desconhecer a existência autónoma destes valores.
  3. Uma objeção a esta linha de pensamento pode ser que, se aceitarmos o subjetivismo meramente por razões de tolerância, teremos também de aceitar e tolerar aqueles que não aceitam e toleram. Por exemplo, teríamos de aceitar alguém que acreditasse que matar os que não concordassem com ele em qualquer assunto (política, ética, estética, etc.) seria aceitável.

Argumentos a favor do objetivismo

  1. Argumento das consequências moralmente indesejáveis: Os objetivistas argumentam que, se aceitarmos o subjetivismo, teríamos de aceitar que linhas de pensamento moralmente reprováveis atualmente (e.g. as visões sobre a escravatura de antigamente, as visões sobre as "raças inferiores" dos nazis) não são nem mais nem menos corretas na nossa sociedade moderna. 
  2. Argumento da capacidade explicativa: Ao aceitar o subjetivismo, estamos a aceitar que não há um juízo de valor mais ou menos correto que outro, o que vai contra o que está profundamente enraizado em nós. Por exemplo, quando se discute a beleza do quadro Poker Game, existem certamente (para os objetivistas) maneiras melhores e piores de defender a beleza do quadro. Por exemplo, dizer que o detalhe é imenso será uma maneira certamente melhor de defender a beleza do que dizer que o quadro vendeu por mais de quinhentos mil dólares. Porém, se adotarmos um ponto de vista subjetivista, tal distinção desaparece, e as opiniões de especialistas, por exemplo, são uma perda de tempo.
  3. Poker Game
    Argumento da coincidência de valores: Neste argumento, o objetivista usa o argumento da diversidade contra o subjetivista, afirmando que existe uma enorme coincidência em valores morais e estéticos (embora com divergências, que se atribuem a erros e falta de formação e educação). Por exemplo, no campo da ética, virtualmente todas as sociedades modernas consideram reprovável a pedofilia e o homicídio. A melhor maneira de explicar isto é que estes valores existem objetivamente.
  4. Argumento do dissidente: Este argumento foca-se no relativismo cultural, e diz-nos que, visto que, segundo os subjetivistas, os valores, por exemplo, morais são o espelho da sociedade em que se encontram, como se explica que as sociedades mudem de valores? Afinal, os sujeitos teriam de considerar algo moralmente reprovável, dentro de uma sociedade em que esses valores se refletiam, algo que parece impossível de explicar usando o relativismo cultural.

Exercícios

1) Liga os seguintes termos à sua definição.
1 - Psicologismo
2 - Emotivismo
3 - Naturalismo

A - Os valores exprimem as emoções e/ou sentimentos do sujeito.
B - Os valores são uma qualidade intrínseca aos objetos.
C - Os valores exprimem a natureza psico-comportamental do sujeito.


2 - Completa a frase.
No objetivismo, os valores são ________.

3 - "Será que esta ação é eticamente correcta?» é uma questão de que ordem?


Resolução

1)
1 - C
2 - A
3 - B

2 - imutáveis

3 - Segunda ordem.

Referências

Pedro Galvão, António Correia Lopes: Preparação para o Exame Final Nacional Filosofia 11º ano
http://www.philosophy-dictionary.org/Axiological_subjectivism
http://sofos.wikidot.com/historicidade-perenidade
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/d/d2/Van_Gogh_-_Trauernder_alter_Mann.jpeg/800px-Van_Gogh_-_Trauernder_alter_Mann.jpeg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/7/7a/Cassius_Marcellus_Coolidge_-_Poker_Game_%281894%29.png/1280px-Cassius_Marcellus_Coolidge_-_Poker_Game_%281894%29.png
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