sábado, 25 de novembro de 2017

Política Hoje - Neutralidade na Internet



   Se for um utilizador ávido da internet, provavelmente reparou que um dos grandes tópicos de discussão recentemente é a Net Neutrality (inglês para Neutralidade na Internet). ou seja, as regras que fiscalizam o acesso à internet. Mas porque é que isto é discutido agora? Gostaria de analisar este tema por fases.


    O que é a Net Neutrality?

    É a lei que assegura a imparcialidade de acesso a qualquer tipo de dados que se encontre na internet. Quer seja o Twitter, Youtube, Blogger, Wikipedia, entre outros, cada um destes sites, aplicações ou serviços são protegidos de qualquer imposição que qualquer operadora de telecomunicações imponha sobre o uso da rede dos consumidores. 

    Para fins de esclarecimento, exemplos de práticas que são proibidas por parte do seu operador de telecomunicações, segundo estas leis, são: a transformação seu serviço de internet numa "autoestrada", impondo por cada site uma comissão para que o acesso às suas páginas seja facilitado; o benefício de serviços disponibilizados pela operadora, em detrimento de outros semelhantes, podendo até bloquear o acesso à competição.

O exemplo da autoestrada em formato de imagem
Da esquerda para a direita, nas placas lê-se: "Internet sob regulação acaba aqui", "Acesso exclusivo a pagamentos especiais", "Qualquer outra pessoa".
Balão de fala das grandes empresas: 
"Funciona para mim!"

    Porque é que muitas pessoas estão interessadas agora?

   A atual discussão começou quando a entidade reguladora dos serviços de telecomunicações dos EUA (Comissão Federal de Comunicações, ou FCC na versão inglesa) realizou este ano a substituição do seu chairman por outro indicado pelo presidente Trump (passado um ano ainda custa escrever esta sequência de palavras). Este novo líder é Ajit Pai, antigo trabalhador e associado da operadora Verizon no departamento da justiça.

   Sem grandes surpresas, Ajit acende a discussão sobre a Net Neutrality ao declarar uma data para a discussão e abolição das regras em congresso. Porquê?  Supostamente, estas regras impedem que as operadoras tenham fundos suficientes para investirem nas suas infraestruturas no futuro, algo necessário uma vez que os websites têm-se tornado cada vez mais sofisticados e acabam por exigir um serviço de banda larga mais exigente.

Ajit Pai, e a sua caneca cheia de frustrações dos consumidores
     Mas supondo agora que existe esse investimento, iria ele ter esse fim? Não. As operadoras nos Estados Unidos já provaram várias vezes que são capazes de recorrer a todos os métodos que conseguirem inventar para arrecadar capital (incluindo vias atualmente ilegais), sem haver preocupação com a satisfação do consumidor. Exemplo disso foi quando a T-Mobile, em conjunto com outras operadoras, bloquearam o acesso ao serviço Google Wallet para favorecer a sua versão idêntica e com um nome deveras pior (1).

Tradução: "De acordo com a Samsung USA ou a T-Mobile ou a Google estão a impedir o funcionamento da Google Wallet no Note 2. Quanto tempo até ficar resolvido?
(T-Mobile USA) Nós apoiamos a ISIS, o serviço standard para pagamentos sem fios em dispositivos móveis :)"
Sim, o nome do serviço da T-Mobile chama-se ISIS.

Não, o nome não é inspirado no grupo terrorista e desde 2014 que foi alterado.
Sim, a conversa fora de contexto é insólita
     E para quem pensa que este tipo de práticas é impossível no mercado livre atual, não se esqueça do principal princípio que o regula: a competitividade! No caso norte americano, a maioria das zonas residenciais não têm mais do que uma operadora de telecomunicações disponível. Portanto, mesmo que não quisessem alimentar negócios desfavoráveis, não teriam outra opção senão pagar à mesma se quisessem internet, logo, são forçados a entrar no monopólio.

Exemplo do estado do Minnesota, em Junho de 2013 (2)

      Neste momento, vários consumidores e empresas como a Google e a Amazon já manifestaram publicamente o seu desagrado, e estão a planear uma manifestação a nível nacional no dia do debate em congresso (7 de dezembro), especificamente junto a revendedoras da operadora Verizon (3).

      Caso se venha a realizar a abolição das regras de neutralidade nos EUA, será uma grande derrota para a liberdade de expressão nos tempo modernos após a queda do muro de Berlim.

    E o panorama português?

      As operadoras portuguesas são apontadas como um exemplo negativo dos efeitos de um país sem uma forte política no tráfego da internet, sendo a MEO Altice considerada a pior pelos seus planos de dados móveis que favorecem o consumo de internet por telemóvel de forma privilegiada em certas aplicações a troco de um pagamento especial.

Exemplo de práticas por parte da MEO Altice conotadas como negativas com a atual legislação

      Apesar disso, a União Europeia tem reforçado as políticas relativas ao uso deste tipo de telecomunicações, sendo a mais recente vitória a abolição de taxas especiais para chamadas e consumo de dados móveis no estrangeiro dentro da Zona Euro para cidadãos europeus.

    Conclusão

    A internet, sendo uma tecnologia relativamente recente na sociedade moderna, encontra-se numa situação jurídica complicada. As conquistas feitas não se encontram garantidas, e por isso algumas comunidades internacionais são forçadas a agir para preservar os seus direitos.
   
     No entanto, é importante não desviar a atenção das verdadeiras prioridades. O que se pretende é, acima de tudo, assegurar o direito à liberdade de expressão em qualquer meio de comunicação social.



Referências no artigo:

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

O Deambular na Polis - 2

Temos medo de que os extremistas cheguem ao poder. Simplificando massivamente, tal deve-se a uma de duas coisas: ou não compreendemos a sua luta e o porquê da sua enorme afeição a determinada política, ou são exemplares das mais baixas evoluções societais ao nível do(s) indivíduo(s).
 Mas e se os extremistas já estiverem no poder, mascarados de progressistas, liberais (quer a nível económico ou a nível social), ou homens de lei?Observámos isto esta semana, quando uma mulher, vítima de violência doméstica, foi apelidada, por parte de indivíduos (incluindo uma mulher) ligados a cargos importantíssimos no sistema judicial português, de p***. Os agressores acabaram por receber penas leves (como já é hábito em Portugal) e atenuadas. Mas, porque foram atenuadas? Ora, porque a Bíblia defende que a mulher adúltera - como era o caso desta senhora - merece a pena de morte. Observa-se aqui, então, uma triste realidade: os extremistas já estão entranhados no sistema.
 Levantam-se duas questões:
 1) Poderá um livro religioso ditar o destino de "criminosos"?
 2) Qual foi a reação da sociedade perante esta demonstração de atitudes retrógradas?
 Vejamos primeiro o segundo ponto: a reação foi, no geral, negativa. Críticas chegaram de todos os lados: associações de defesa das mulheres, outras figuras de autoridade, e, interessantemente, de extremistas de um lado do espetro político tradicional, mas não do outro. Porque é isto interessante? Porque os islamofóbicos (apesar de preferirem ser chamados de "Defensores da Cultura Europeia"), que normalmente defendem a sua posição anti-imigração com o argumento de que "O Corão defende os maus tratos contra as mulheres, os infiéis, etc. ad nauseam" permaneceram quietos e calados. Porquê? Porque, desta vez, o problema se passou na tão querida pátria amada, e não num país muçulmano? Porque a Bíblia está sempre certa?
 Aproveito para recordar que uma das posições inicialmente defendidas por estes políticos de bancada era a da defesa incondicional da mulher europeia, devido a uma série de casos de violações atribuídos aos refugiados. Porquê a mudança tão drástica de posição? Não há problema, pois foi lido o livro que lhes convém, ou não lhes convém desta vez a defesa das mulheres europeias?
Quanto toca à filosofia, aproximam-se de Hipócrates, mas só em nome.
 Que esta situação sirva de aviso: os extremistas já se infiltraram no sistema. Agora, cabe ao povo decidir: somos ou não um estado laico? Ou voltaremos à Inquisição?

Blade Runner, de Ridley Scott (1982)

Acerca do visionamento e comentários dos alunos de FILOSOFIA A – leituras e reflexões retiradas dos trabalhos realizados pelos/as alunos/as:
Roy Batty
Blade Runner é um filme que pode ter uma leitura filosófica, se entendermos que a questão que lhe subjaz é a questão fundamental da Filosofia: o que é o Homem?

Perguntar «o que é o Homem?» é procurar onde reside a sua Humanidade. 
Podemos, desde logo, afastar o critério do aspeto ou aparência (os Replicantes Nexus 6 são robôs perfeitos, andróides com aspeto humano), na senda, aliás, da Filosofia clássica desde Parménides de Eleia e Platão.

Poderemos, então, encontrar esse critério na Razão, como afirmou o Racionalismo e o Idealismo? Blade Runner demonstra a insuficiência desta resposta. Os robôs da série Nexus 6, os Replicantes – principais personagens do filme, a par do seu caçador, Rick Deckard – sendo idênticos aos seres humanos ao ponto da sua identificação ser demasiado difícil e subtil, eram, no mínimo tão inteligentes quanto os engenheiros genéticos que os criaram. Foram criados para colonizar outros planetas, sendo usados como escravos em tarefas perigosas e situações de alto risco – foram, portanto, concebidos como se fossem seres humanos elevados à perfeição: mais inteligentes, mais ágeis, mais fortes, mais belos.  Após um motim violento protagonizado por um grupo de Replicantes Nexus 6, são declarados ilegais; alguns fogem para a Terra. Os Blade Runner são a polícia especial cuja missão é exterminar os Replicantes fugitivos – ‘atirar a matar’. A solução final é entregue a Deckard.


Mas o que  distingue, afinal, os Replicantes dos seres humanos? As Memórias (ou melhor, a sua ausência, uma vez que não tiveram infância). As Emoções (o seu criador não lhes teria inculcado a faculdade emocional). E a Duração (os Replicantes Nexus 6 estavam programados para uma vida útil de apenas quatro anos).

Todos estes critérios vão sendo postos em causa no decorrer do filme: as memórias ‘fictícias’ de uma infância que não tiveram mas ‘criaram’ questiona, também, a essência da Memória, desse reservatório seletivo com o qual reescrevemos grande parte do passado a partir da inteligibilidade do presente.

A memória, as emoções e os sentimentos que, afinal os Replicantes desenvolveram estão na base de uma das cenas clássicas do filme e do cinema, a morte de Roy. Depois de salvar o seu perseguidor da morte, mostrando a clemência que a ‘humanidade’ de Deckart, o caçador de androides, não logrou, Roy recorda com emoção o que viveu e assinala que essas recordações morrerão com ele, dissolver-se-ão como lágrimas na chuva.


Esta cena, de uma extraordinária beleza, interpela temas clássicos da Filosofia, como a existência de Deus e a imortalidade da alma; interpela, conjuntamente, o problema do sentido da existência, da morte e da finitude.
Será que os andróides conquistarão, também uma vida para além dos quatro anos da sua duração útil? Esta questão decorre do filme e da cena da morte de Roy – será, quiçá, a pomba que se liberta das suas mãos, como uma ‘alma’ que busca a eternidade. Não esqueçamos que, qual Zeus que vence o seu divino pai, Cronos, Roy assassinara com as suas mãos potentes, Tyrell, o criador dos Replicantes que se negara a aumentar-lhes o tempo de vida. A morte de Deus.



O que é o ser humano? Qual o caminho da humanidade, senão, dirão os existencialistas, a infinita angústia da consciência da finitude? Agora, mais abandonado, num universo onde ‘Deus está morto’?  Esta é a essência do ‘ser homem’, a busca transcendente que, no filme, é empreendida pelos andróides, mais humanos do que os humanos: são eles que questionam o sentido da finitude, são eles que procuram Deus como resposta possível – e não a encontram. Assim, a morte de Roy é a morte de um homem sem deus, é, de certa forma, a morte de deus afirmada numa atmosfera cinzenta, chuvosa e niilista, sob o céu de uma inclemente Los Angels, algures no futuro representado no ano de 2019. 


FICHA TÉCNICA:

Título original - Blade Runner
Ano - 1982
Duração - 117 min.
País: Estados Unidos
Diretor: Ridley Scott
Guião: David Webb Peoples, Hampton Fancher (Novela: Philip K. Dick)
Música: Vangelis
Fotografía: Jordan Cronenweth
Elenco de atores: Harrison Ford, Rutger Hauer, Sean Young, Daryl Hannah, Edward James Olmos, Joanna Cassidy, Brion James, Joe Turkel, M. Emmet Walsh, William Sanderson, James Hong, Morgan Paull, Hy Pyke
Produtora: Warner Bros. / Ladd Company / Shaw Brothers

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

O Deambular na Polis - 1

Serão as teses antigas ainda úteis? Serão mutáveis?
O problema que colocarei hoje em cima da mesa de operação, para ser dilacerado e tão profundamente cortado quanto possível, envolve uma das minhas "filosofias" preferidas: o Estoicismo.
Ora, os estoicos eram árduos defensores de que nunca deveriamos tratar os que nos trataram incorretamente da mesma maneira; ou seja, não só não pagar na mesma moeda, como nem um único cêntimo dar de volta aquele/a vagabundo/a que nos maltratou.
Um exemplo dado é o de uma simples pergunta: Faria sentido morder um cão caso este nos mordesse, dar um pontapé numa mula na eventualidade de esta nos dar um coice, etc.?
Ora, aqui encontramos um problema na prática estóica, que, na verdade, não é um problema mais do que uma simples característica desta doutrina filosófica: aceitar a natureza, e, igualmente importante, mudar o que se consegue mudar, e o que não se consegue mudar aceitar.
Os mais famosos filósofos argumentavam também que a fúria se mantinha na nossa alma mais tempo do que o ódio.
Logo, voltando à pergunta: posso eu pagar na mesma moeda?
Ora, não podemos aqui criar um falso dilema. Cada situação terá a sua maneira de ser interpretada, o que também variará de indivíduo para indivíduo.
Se aceitarmos esta doutrina a cem por cento, não teremos, na condição de sermos completos mestres de nossos corpos e almas, mais infelicidades, mágoas, etc., porém, estamos também a deixar com que nos aconteçam eventos da mais baixa ralé, e não podemos reagir de qualquer maneira.
Passando de uma das minhas bases para outra, vejamos Hegel, que, se não me engano, afirmou que as doutrinas antigas em nada se aproximavam às doutrinas da sua altura, pois os problemas do Homem evoluiram.
Aqui está o fundamento para a ressurreição do Estoicismo como força de auto-ajuda e de bem-estar geral. Pois, como disse o meu tão estimado Karl Marx nas suas "Teses sobre Feuerbach": "Os filósofos até hoje focaram-se apenas em analisar o mundo de diferentes maneiras; o objetivo é mudá-lo.".
Por estas razões, na minha opinião, a primeira coisa que um estóico do século XXI tem de aceitar é a mutação inerente que a sua doutrina sofreu, sofre, e sofrerá ao longo dos tempos; quer seja para melhor ou para pior no momento imediato, mas sempre confiante que o magnífico pêndulo da história se movimenta para o bem. Por isto, as antigas teses filosóficas são de extrema importância, desde que sofram mutações ao longo do tempo, com o objetivo de as aperfeiçoar e de as adaptar às condições do presente.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Política Hoje: Venezuela de Maduro

   Nos últimos anos, a Venezuela tem passado por uma crise política que se tem agravado ao longo do tempo, tendo eclodido no que se vê agora frequentemente nos jornais: uma guerra civil entre chavistas e manifestantes, sendo cada vez mais evidente a falta de recursos básicos essenciais para cumprir a constituição universal dos direitos humanos. Mas, para muitos, isto não é novidade. 

O início do fim da democracia na Venezuela

   Porque é que só agora é que os media nos estão a "bombardear" com esta informação? Comecemos pelas perguntas mais estruturantes.

  • O que se passa na Venezuela?
   Durante o mês de março deste ano, o Supremo Tribunal de Justiça venezuelano (órgão em que o painel de juízes é dominado por apoiantes leais a Maduro) anunciou a transferência dos poderes da Assembleia Nacional (ou Parlamento, segundo os termos portugueses) para si, sabendo que no Parlamento, a oposição a Maduro detém a maioria. Esta decisão foi revertida perante a manifestação interna e externa ao país, apesar de não ter sido o suficiente para acalmar os protestos.
    Este momento tornou explícita a intenção do Governo da Venezuela de se tornar numa ditadura.

Supremo Tribunal de Justiça venezuelano

   Pouco tempo depois, no início de maio, Nicolás Maduro anunciou o seu intento de criar um órgão que iria ajudar a reescrever a constituição em vigor, sendo atribuído a este órgão poderes previamente exclusivos ao Parlamento. Por outras palavras, pretendia-se criar um parlamento em paralelo com o existente, só que a favor de Maduro e mais poderoso que o em vigor. Os seus membros foram escolhidos no passado dia 30 de julho, e, como previsto, foram declaradas várias falhas no sistema eleitoral que indicaram para uma fraude na eleição realizada, o que estabeleceu a soberania de Maduro.

"Uma Assembleia Constituinte, eleita em condições duvidosas e com frequentes circunstâncias violentas não pode ser parte da solução. (A Assembleia eleita) aumentou a divisão e deslegitimará mais as instituições eleitas democraticamente na Venezuela", declarações da porta-voz da Comissão Europeia, Mina Andreeva, após as eleições na Venezuela
    A saída do Governo venezuelano da Organização de Estados Americanos (OEA) em abril deste ano, duas grandes greves gerais convocadas pela oposição, várias manifestações nas ruas da capital, referendos simbólicos organizados pela oposição realizados como manifestação do desagrado do povo venezuelano e alterações no Supremo Tribunal de Justiça, tudo isto levou ao "rebentar da bolha" que hoje vemos nos telejornais pelo mundo.

  • Porque é que se está a forçar a revisão da Constituição?
   Segundo o Presidente Maduro, esta revisão permitirá que o Presidente possa impedir os golpes de Estado que o grupo "fascista" venezuelano (traduzido, a oposição) intente, podendo desse modo impor "a paz, a harmonia e um verdadeiro diálogo nacional”. Para além disso, acredita que pode ajudar o país a sair da grave crise económica em que se encontra, provocada pela descida de valor do petróleo nos mercados internacionais.


Paz e amor?
  • Quem é a oposição de Maduro?
   A coligação Mesa para a União Democrática (MUD), formada pelos principais partidos da oposição ao Governo em vigor. Estes manifestam-se contra a tentativa de Maduro perpetuar a sua estadia no poder, acabar com a distribuição de poderes e legitimar a perseguição daqueles que se opõem ao regime. Por outras palavras, opõem-se à criação do "Estado Novo 2.0",versão venezuelana, como já tinha sido evidenciado anteriormente.


  • O que se pode esperar nos próximos dias?
   Por agora, os ânimos dos media devem resfriar. Já foi "posto em cima da mesa" a hipótese de intervenção militar pelos EUA para resolver a crise no país, mas nesta passada segunda-feira, países como a China e o Uruguai recusaram a hipótese.

Se substituíssem os intervenientes por Bush e Saddam Hussein,
diria que estava a ler a mesma história

   Para além disso, no aeroporto da Madeira continuam a chegar dezenas de emigrantes todos os dias, sendo o espanhol uma segunda língua na ilha até se "estabelecer a poeira levantada".

   Na minha opinião, espero que se encontra uma resolução rápida que não recorra a intervenções militares. No entanto, caso se alcance esse nível de desespero, evitar uma conclusão como teve o regime de Saddam Hussein deverá ser uma prioridade.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

A Europa dos Cafés


« A Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa frequentados pelos gangsters de Isaac Babel. Vão dos cafés de Copenhaga, onde Kierkegaard passava nos seus passeios concentrados, aos balcões de Palermo. Não há cafés antigos ou definidores em Moscovo, que já é um subúrbio da Ásia. Poucos em Inglaterra, após um breve período em que estiveram na moda, no século XVIII. Nenhuns na América do Norte, para lá do posto avançado galicano de Nova Orleães. Desenhe-se o mapa das cafetarias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da 'ideia de Europa'.
O café é um local de entrevistas e conspirações, de debates intelectuais e mexericos, para o flâneur e o poeta ou metafísico debruçado sobre o bloco de apontamentos. Aberto a todos, é todavia um clube, uma franco-maçonaria de reco
nhecimento político ou artístico-literário e presença pragmática. Uma chávena de café, um copo de vinho, um chá com rum assegura um local onde trabalhar, sonhar, jogar xadrez ou simplesmente permanecer aquecido durantetodo o dia. É o clube dos espirituosos e a poste-restante dos sem-abrigo. Na Milão de Stendhal, na Veneza de Casanova, na Paris de Baudelaire, o café albergava o que existia de oposição política, de liberalismo clandestino. Três cafés principais da Viena imperial e entre as guerras forneceram a agora, o locus da eloquência e da rivalidade, a escolas adversárias de estética e economia política, de psicanálise e filosofia. Quem desejasse conhecer Freud ou Karl Kraus, Musil ou Carnap, sabia precisamente em que café procurar, a que Stammtish tomar lugar.»

George Steiner, A Ideia de Europa

sábado, 8 de julho de 2017

Filofofocas Edição Nº2: Problemas de relacionamento

Página 5

 Se tem problemas de relacionamento, reunimos aqui três dicas para o ajudar a ultrapassar estes tempos difíceis com o seu parceiro!

Hegel

 Hegel ensina-nos através da sua Dialética que, quando nos encontramos num mau lugar, virão aí tempos melhores. Mas como funciona esta Dialética? Trata-se de um programa de três passos, que consiste na Afirmação, Negação, e na Negação da negação
 Um exemplo, com base histórica, é o seguinte:
Hegel
  • Afirmação: Atenas possuía uma grande quantidade de liberdades civis, porém, pouca organização militar;
  • Negação: Atenas eventualmente caiu nas mãos dos Persas, que tinham poucas liberdades civis, mas muita organização militar;
  • Negação da negação: De seguida, Roma emergiu, com um melhor balanço entre liberdades civis e organização militar.
 Podemos observar assim, que, para Hegel, o mundo avança sempre rumo ao melhor caminho, ao caminho com o melhor balanço de tudo o que é necessário, tal como a sua relação! Hoje pode estar num dia mau, mas amanhã irá encontrar a melhor conjugação de todos os fatores envolvidos nesta! (Aproveite esta oportunidade para ler com o seu parceiro A Fenomenologia do Espírito! Se o seu parceiro não compreender, ele não o merece.)

Sócrates

Sócrates

 Lembra-se de lhe terem ensinado a respeitar e não ser muito apegado ao seu parceiro? Sócrates discordaria! O famoso "moscardo de Atenas" debatia filosofia com toda a gente que passava, especialmente os Sofistas, tão odiados por ele.
 Por isso, afirme-se, e fale com o seu parceiro. Pergunte-lhe o que se passa, e, momentos depois, tente discutir um pouco de filosofia.
 Não se preocupe! A cicuta já não é proeminente!

Marx

Marx
 Derrube o capitalismo com o seu parceiro! Levante-se e mexa-se, sinta as suas correntes, que o prendem ao chão! Abaixo com a burguesia e a sua escravatura moderna! Proletários do mundo, uni-vos!

 

 

Astrologia

Com: Pitágoras

Pitágoras
 Os planetas descreveram órbitas puramente geométricas, calculadas, obviamente, através da razão de dois números inteiros. Tal é prova conclusiva que você, querido leitor, devia juntar-se ao meu culto à minha escola!





















Bibliografia:
http://cliparting.com/wp-content/uploads/2017/02/Explosion-clip-art-tumundografico-4.png (02-03-17)
http://cdn.shopify.com/s/files/1/1061/1924/products/Broken_Red_Heart_Emoji_grande.png?v=1480481034 (08-07-17)
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/08/Hegel_portrait_by_Schlesinger_1831.jpg (08-07-17)
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/68/Vatsoc.jpg/150px-Vatsoc.jpg (08-07-17)
http://www.citador.pt/images/autorid00097.jpg (08-07-17)




quinta-feira, 15 de junho de 2017

Guia compreensivo para o estudante: 10º ano, Ensino Regular - Aula θ (1)

Aviso

 Nesta lição trataremos da religião. Porém, este estudo poderá ser, segundo o currículo de Filosofia do 10º ano, pelo estudo da estética. Para tal lição, verifique-se a lição θ (2).

Religiões a estudar

 Existem inúmeras religiões espalhadas um pouco por todo o mundo. Porém, neste artigo, iremos explorar as chamadas Religiões reveladas ou Religiões do livro. Estas religiões são:
  • Judaísmo;
  • Cristianismo;
  • Islamismo.
 Estas religiões têm várias diferenças, porém, também têm várias semelhanças. Estas semelhanças incluem o facto de serem religiões monoteístas, ou seja, admitem a existência de um único Deus, que é absoluto e verdadeiro, e o facto de possuírem um livro sagrado, que contém a palavra de Deus.

Para que são necessárias as religiões?

 A necessidade das religiões é normalmente descrita como sendo o facto de dar sentido à vida. Isto provém do facto que religiões como, por exemplo, o Cristianismo, dizerem explicitamente que existe vida após a morte, e que existe, neste caso, um Paraíso e um Inferno.
 Para além disto, Deus é visto como tendo criado tudo com um propósito, e é também visto como tendo prometido uma recompensa (o Paraíso) para os que cumprem Sua vontade. Cumprir a vontade deste ser superior e ser, por isso, recompensados com uma vida após a vida terrena é visto como uma maneira de estabelecer um significado para a vida pelos religiosos.

Posições sobre a existência de Deus

 Existem várias posições relativamente à existência de Deus, que se englobam em três categorias:
  • Deus existe - Teísmo, Deísmo, Panteísmo, Fideísmo;
  • Não se sabe se Deus existe - Agnosticismo;
  • Deus não existe - Ateísmo.
 Aprofundemos as posições que defendem que Deus existe.
  • Teísmo - Deus é exterior e superior ao mundo, e é o seu criador.
  • Deísmo - Deus criou o mundo, porém, não interfere com ele presentemente.
  • Panteísmo - Deus é o Mundo em si. Tudo e todos compõem um Deus abrangente, e o Universo é idêntico a Deus.
  • Fideísmo - A razão e a religião são incompatíveis. Defendido pelo filósofo Søren Kierkegaard.

Argumentos religiosos

 Estudarás três argumentos a favor da existência de Deus. Vejamos:
  • Argumento ontológico: Se Deus é um ser perfeito, pode ser imaginado, e a existência é mais perfeita do que não existência, então Deus necessariamente terá que existir.
  • Argumento cosmológico: Este argumento diz-nos que tudo teve de ter uma origem (princípio causa-efeito), e, visto que o Universo existe, teve de ter uma origem, que é Deus.
  • Argumento do Desígnio: Este argumento compara o mundo a um relógio, e pode ser expresso da seguinte maneira:
  1. «O relógio, pela sua complexidade e pelo modo como está ordenado, é uma máquina que tem que ter um autor e construtor inteligente, com capacidades proporcionais à sua obra — o relojoeiro humano.»
  2. «O mundo, pela sua complexidade e pelo modo como está ordenado, é como um relógio.»
  3. «Logo, o mundo também tem que ter um autor e construtor inteligente, com capacidades proporcionais à sua obra — o relojoeiro divino (Deus).(1)

Argumento de Kant (agnóstico)

  • Para Kant, Deus não pode ser conhecido, logo é somente uma "ideia". Porém, se podemos imaginar um ser sumamente perfeito e sumamente bom, temos o Dever de viver como se ele existisse.

Argumento ateu

  • Argumento do mal: Se Deus é sumamente bom, omnisciente, e omnipotente, porque existe mal no mundo? Se ele desconhece o mal, então não é omnisciente. Se conhece o mal mas não o consegue corrigir, então não é omnipotente. Finalmente, se conhece o mal mas não o corrige, então não é sumamente bom.
  • Os ateus colocam ainda o ónus da prova nos religiosos, ou seja, são os religiosos que devem apresentar as provas da existência de Deus, e não os ateus a provar que Deus não existe.  

Exercícios

1 - Qual dos argumentos religiosos compara o mundo a um relógio?
2 - Que filósofo argumentou que Deus é somente uma "ideia"?
3 - Qual é o outro nome das Religiões reveladas?

Resolução

1 - Argumento do Desígnio.
2 - Immanuel Kant.
3 - Religiões do livro.

Notas

(1) - Retirado de http://criticanarede.com/fil_designio.html

Bibliografia

https://www.gotquestions.org/Portugues/argumento-ontologico.html
http://criticanarede.com/fil_designio.html

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Guia compreensivo para o estudante: 10º ano, Ensino Regular - Aula η

Ética e moral

 Apesar de parecerem semelhantes, a ética e a moral têm importantes distinções.
 Ambas podem responder à pergunta «O que devo fazer?», mas respondem de maneiras diferentes.  Exploremos então em maior detalhe este tema.
 Primeiro, há que notar que, para se responder à pergunta acima colocada, temos que ter como pressuposto que existe livre-arbítrio, afinal, se tudo estivesse determinado, não faria sentido colocar esta questão.
 Enquanto a moral formula normas e regras que devemos aceitar (ou seja, é normativa), e pretende apresentar o que é mais correcto (ou seja, é prescritiva), a ética é reflexiva, filosófica, e especulativa.
 A ética tenta descobrir e revelar os princípios orientadores da ação, e, assim, chegar aos fundamentos da moral e a soluções para problemas e dilemas morais.
 Pelo contrário, a moral dá-nos diretamente códigos de conduta.

Direito e ética

 Existem duas definições para a palavra "direito":
Mahatma Gandhi
  • O direito de ter algo, fazer algo, etc. (O José tem direito a comer um chocolate.);
  • O conjunto das normas públicas que definem os direitos individuais e os deveres de uma comunidade (O José tem direito ao fundo de desemprego segundo as leis [os Direitos] de Portugal).
 Nota que, na segunda definição da palavra, Direito aparece com a primeira letra maiúscula. Isto deve-se ao facto de, quando queremos distinguir entre as duas definições, capitalizamos a primeira letra, no caso de estarmos a falar da lei de determinada comunidade.
 Apesar do Direito ter os seus fundamentos na ética, existem várias ocasiões em que o Direito permite algo que é eticamente reprovável. Alguns indivíduos, alguns extremamente conhecidos como Mahatma Gandhi, respondem a estes problemas utilizando a desobediência civil.
 A desobediência civil é o ato público e pacífico de não cumprir uma lei, que é considerada pelo indivíduo em questão como sendo injusta eticamente para a população em geral, com o fim de levar os legisladores e governantes a repensar a lei, e, eventualmente, modificá-la ou revogá-la. Um exemplo de desobediência civil ocorreu na altura da independência da Índia, Paquistão, e o que seria mais tarde o Bangladesh, quando Gandhi e seus seguidores usaram a desobediência civil para conseguir a tão desejada independência da potência colonial que era o Império Britânico.

Política

Questões políticas

 A filosofia política preocupa-se com três tópicos:
  1. Justificação do Estado;
  2. Lei;
  3. Justiça social.
 Existe um objetivo comum a todos os filósofos que se ocupam deste tema: o bem-estar, quer seja do indivíduo - através da Ética, pois trata-se de respeitar a individualidade e subjetividade - ou do cidadão - através da política, pois o cidadão faz parte de uma comunidade.

Teorias para a justificação do Estado

 Estudarás duas teorias para a justificação do Estado: a teoria da origem natural, defendida por Aristóteles (denominada de Naturalismo Político), e a teoria da origem contratual, defendida por vários filósofos, dos quais estudarás apenas Hobbes, Locke e Rawls (denominada de Contratualismo).

Naturalismo Político

 Para compreendermos corretamente a explicação que se segue temos de conhecer um termo e a estrutura política na altura de Aristóteles:
Aristóteles
  • A sociedade grega tratava-se de uma sociedade esclavagista.
  • Apenas os cidadãos tinham direito ao voto, sendo que apenas homens, maiores de idade, e filhos de pais da cidade-estado em questão (neste caso, Atenas) eram considerados cidadãos.
  • Polis: O nome que se dava às cidades-estados.
 Aristóteles defende que a polis surgiu de origem natural. Primeiro, homem e mulher uniram-se com o intuito da reprodução, e o mestre e o escravo juntaram-se com o intuito da auto-preservação. O mestre usou o seu intelecto para governar, e o escravo as suas capacidades físicas para trabalhar.
 De seguida, a família surgiu naturalmente de forma a servir as necessidades do dia-a-dia. Após isso, também de acordo com a natureza, as famílias juntaram-se, devido a mais e novas necessidades, numa aldeia. Finalmente, forma-se a cidade, que «é uma comunidade completa, formada a partir de várias aldeias e que, por assim dizer, atinge o máximo de auto-suficiência. Formada a princípio para preservar a vida, a cidade subsiste para assegurar a vida boa.»(1)
 Conseguimos aqui observar que Aristóteles considerava a escravatura como algo natural, e também a superioridade do homem sobre a mulher.

Contratualismo de Hobbes e de Locke

 O contratualismo consiste, no geral, em afirmar que o Estado surgiu por meios de um "contrato social", em que os indivíduos concordaram em criar um Estado como meio de proteção pessoal, e pôr assim fim ao estado natural (em que todos eram totalmente livres e absolutamente iguais).
 Para os contratualistas existem três direitos básicos do Homem:
  • O direito à vida;
  • O direito à liberdade;
  • O direito à propriedade.
 Falaremos agora de dois dos três filósofos contratualistas do currículo do 10º ano: Thomas Hobbes e
John Locke.

Thomas Hobbes

Thomas Hobbes
 Hobbes acreditava que «o Homem é o lobo do Homem», ou seja, que o estado de natureza consistia num estado de extrema insegurança, e que correspondia à constante ameaça e à guerra de todos contra todos.
 Thomas Hobbes considerava que, no estado natural, nenhum direito fundamental era respeitado, e, por isso, o medo da morte levou os Homens a criar um estado absoluto, em que o soberano é todo-poderoso.
 Hobbes defendia que este sistema era o melhor possível, e que o contrato social, uma vez "assinado", não era revogável, nem reconhecia o direito de revolução ou rebelião. Qualquer tipo de tentativa de destronar o soberano deveria ser esmagada.
 Para Hobbes, as leis tinham origem na vontade suprema do soberano, e que este está acima da lei.

John Locke

John Locke
 Locke vai contra Hobbes em vários aspetos. Por um lado, John Locke acreditava que o estado de natureza é um estado de paz, boa vontade e de assistência mútua, mas em que não se respeitava o direito de propriedade. Era este desrespeito por um direito aparentemente tão essencial que levava o Homem a "assinar" o contrato social.
 Locke defendia um estado de direito liberal, em que as leis têm origem na intenção de preservar os três direitos fundamentais do Homem.
 Por fim, Locke defendia que o contrato social é revogável, se, e apenas se, o governante desrespeitar a lei.

Justiça social

 O termo «justiça social» refere-se à questão: «Como devem ser distribuídos, numa sociedade verdadeiramente justa, quer os benefícios, quer os custos?».
 Existem, no geral, duas formas de responder a esta questão. A primeira é o Igualitarismo, e a segunda é o Liberalismo.
 O Igualitarismo defende que a Igualdade deve ser total, e que o estado deve ser o representante do Bem Comum, e deve possuir mecanismos de intervenção económicos e sociais.
 O Liberalismo defende a liberdade quanto toca aos três direitos básicos do Homem, e advoga a favor de um estado fraco e não interventivo.

John Rawls

 John Rawls foi um filósofo do século XX e do início do século XXI que defendia o Liberalismo Social, e apresentou-nos a sua ideia de equidade.
John Rawls
 Rawls é considerado como um liberal pois defendia, como veremos mais abaixo, a Liberdade Individual acima de tudo. Este filósofo também se opunha ao Igualitarismo, pois considerava que era admissível, e até desejável, um certo grau de desigualdade, com o fim de aumentar a produção e riqueza.
 John Rawls começa a sua filosofia analisando as democracias liberais contemporâneas (e.g. EUA).
 Este filósofo pede-nos para imaginarmos uma situação de partida para o acordo contratualista, a que ele chama de posição original, na qual somos agentes racionais, mas desconhecemos qual vai ser, depois do acordo, a nossa posição social (ou seja, se seremos ricos, pobres, mestres, escravos, etc.). Desconhecemos ainda a nossa raça, sexo, nacionalidade e posições filosóficas, mas conhecemos os "ingredientes" necessários para uma boa vida para a população no geral.
 Desta maneira, ao "assinarmos" o contrato social seremos forçados a pensar e a formar a sociedade de uma maneira o mais imparcial o possível.
 Porquê? Imaginemos que, ao "assinar" o contrato social, um indivíduo defendia a escravatura, e era formada a sociedade com esse princípio em mente. Poderia, depois, "cair a sorte" a esse indivíduo de ele vir a ser escravo.
 Rawls defendia que os seguintes princípios deveriam ser postos em prática numa sociedade, mais ou menos nesta ordem(2):
  1. Princípio da Igual Liberdade: A sociedade deve assegurar a máxima liberdade para cada indivíduo, sendo esta liberdade compatível com a dos demais.
  2. Princípio da Diferença: As desigualdades económicas e sociais serão "manipuladas" de modo a favorecer os mais necessitados.
  3. Princípio da Oportunidade Justa (ou da Igualdade de Oportunidades): As desigualdades económicas e sociais devem estar ligadas a postos, posições e cargos acessíveis a todos, em condições justas de igualdade e de oportunidade.

Robert Nozick

  Nozick era um Libertário radical, que se opôs a Rawls, por considerar que o Princípio da Diferença violava os princípios da liberdade e da propriedade.

Robert Nozick

Exercícios

1) Qual foi o filósofo que se opôs a Rawls, defendendo o Libertarismo radical?
2) Que filósofo defendeu o Naturalismo político?

Resolução

1 - Robert Nozick
2 - Aristóteles

Notas

(1) - Aristóteles, Política (Edição Bilingue)(I.2.1252b27–30)
(2) - O segundo e o terceiro princípios por vezes são trocados de lugar.

Bibliografia

https://www.priberam.pt/dlpo/prescritiva
https://www.priberam.pt/dlpo/normativa
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/d/d1/Portrait_Gandhi.jpg/800px-Portrait_Gandhi.jpg
https://plato.stanford.edu/entries/aristotle-politics/supplement3.html
Pedro Galvão, António Correia Lopes: Preparação para o Exame Final Nacional Filosofia 11º ano
Aristóteles, Política (Edição Bilingue)
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/62/Aristotle_Altemps_Detail.jpg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/d/d8/Thomas_Hobbes_%28portrait%29.jpg/220px-Thomas_Hobbes_%28portrait%29.jpg
https://pt.slideshare.net/filosofiaesjs/concepes-de-justia-e-john-rawls
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/3/3d/John_Rawls.jpg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/1/1d/Robert_nozick.jpg

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Guia compreensivo para o estudante: 10º ano, Ensino Regular - Aula ζ

Ética

 A ética é o ramo filosófico que estuda as ações e como devemos agir.
 Fazem parte do currículo do 10ºano duas teorias do ramo da ética: a teoria de Immanuel Kant e a teoria de John Stuart Mill. Iremos aprofundar, primeiramente, a de Kant. Comecemos.

A teoria ética de Immanuel Kant

Conceitos básicos

 A teoria de Kant baseia-se em classificar o valor ético de uma ação em função da intenção com que foi realizada, inserindo-se assim no "sub-ramo" das teorias deontológicas (nome que provem do grego «deontos» - dever). Kant, e os outros deontologistas, acreditavam que apenas é correto julgar as ações de alguém, de um ponto de vista ético, através das suas intenções, pois apenas estas são controladas pelo agente em questão.

O dever

Immanuel Kant
 Kant acreditava que uma ação apenas é moralmente correcta se a nossa única motivação for o cumprimento do dever. Desta forma, se realizarmos qualquer ação que pareça moralmente correta, mas com algum fim que não cumprir o dever em mente, esta ação torna-se imediatamente incorrecta.
 Por exemplo, a seguinte situação:
  • Uma velhinha, com uma nota de cinco euros na mão, está com dificuldades a atravessar uma rua.
 Alguém que ajudasse a velhinha a atravessar a rua estaria certamente a ser moralmente correcto, certo? Não é assim tão simples, pois a motivação por trás da ação poderia ser incorrecta.
 Por exemplo, se o José ajudasse a velhinha a atravessar a rua, com a motivação de tentar conseguir a nota de cinco euros como recompensa, estaria a agir de uma forma moral e eticamente incorrecta.
 Pelo contrário, se o Carlos ajudasse a velhinha a atravessar a rua, apenas porque tal é o seu dever, estaria a agir correctamente, de acordo com a Ética Kantiana. A este último caso chama-se agir por dever.
 Há ainda o agir conforme o dever. Por exemplo, se nós pagamos os nossos impostos, apenas porque desejamos ser respeitados, receber benefícios, etc., estamos a agir conforme o dever (pagar os nossos impostos). Pagar os impostos apenas por ser o nosso dever, sem ter em mente o respeito que poderá ser ganho ou os benefícios que poderemos receber, é agir por dever.

Imperativo categórico e imperativos hipotéticos

 Kant sugere-nos também a sua ideia do imperativo categórico, com três formulações mais ou menos equivalentes. Mas primeiro temos que compreender o que são os imperativos hipotéticos.
 Imperativos hipotéticos são imperativos cujas regras temos que seguir para conseguir algo. Por exemplo, para sermos pianistas temos que seguir o imperativo hipotético de ter aulas de piano, por exemplo. Podemos resumir este imperativo como:
  • Tem aulas de piano se desejas ser pianista. 
 Prestemos especial atenção ao "se", indicador de um imperativo hipotético. Se não desejarmos ser pianistas, simplesmente não seguimos este imperativo. Daí provém o nome "hipotético", pois é necessário que se tenha preenchido uma condição/hipótese (querer ser pianista), para o seguir.
 O imperativo categórico é diferente, pois deve ser seguido em todas as ocasiões.
 A formulação mais comum do imperativo categórico é a seguinte:
  • Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar princípio de uma legislação universal.
 O que significa isto?
«Quando Kant diz "(...)a máxima da tua ação(...)", ele refere-se à intenção do agente na altura de executar a ação.
  "(...)se possa tornar princípio de uma legislação universal." refere-se ao facto de a nossa ação poder ser aceitável se for aplicada por todos os Homens da mesma maneira. Ou seja, imaginemos uma ação x. Se todos os Homens poderem executar x, e esta ação x se poder tornar uma lei universal (ou seja, não for prejudicial ao Homem, tanto indivíduo como no geral), podemos dizer que tal ação está de acordo com o Imperativo Categórico.»(1)

Ora, vejamos um exemplo:
Schutzstaffel, a polícia nazi que, supostamente, procuraria o Albert.
  • Imaginemos que vivemos na Alemanha sob o governo de Hitler. A polícia bate-nos à porta, e pergunta se vimos o Albert, um judeu que estamos a esconder em nossa casa, e que a polícia alemã pretende matar. O que fazemos?
 Kant responderia da seguinte maneira à questão:
  •  Ao dizermos que não vimos o Albert, estaríamos a mentir, o que vai contra o imperativo categórico, visto que se mentir se tornasse uma legislação universal, e todos os Homens seguissem este princípio, o mundo cairia no caos absoluto. Logo, temos que dizer que o vimos, e indicar onde ele está. 

 Outra formulação do imperativo categórico é a seguinte:
  • Trata sempre as pessoas como fins em si, nunca como meros meios. 
 Explicarei isto por meio de um exemplo. Uma amizade que alguém cria com um fim em mente (e.g. ganhos monetários) trata-se de utilizar uma pessoa como um meio. pelo contrário, a verdadeira amizade, em que vemos a outra pessoa como alguém com ideias, emoções, desejos e liberdade individuais, trata-se de tratar alguém como um fim em si.

Críticas à ética kantiana  

  1. Não resolve conflitos entre deveres: Como observamos anteriormente, a ética kantiana pode-nos dar respostas amargas a certos problemas, porém, existe também o problema do conflito de deveres. Quando entregamos o Albert à polícia alemã, estamos a fazê-lo para não quebrar a máxima "Nunca deves mentir.". Mas, ao mesmo tempo, estamos a ir contra a máxima, igualmente correta, de "Não deves deixar inocentes morrerem.". Este problema deve-se à inflexibilidade da ética kantiana, e à rigidez do seu imperativo categórico.
  2. Desculpa a negligência bem-intencionada: Esta crítica aplica-se ao facto da ética de Kant ignorar as consequências das ações. Assim, se o agente agir com boas intenções, e seguindo o imperativo categórico, mas acabar por causar qualquer tipo de danos que prevaleçam por cima do bem causado, continuará, segundo esta ética, a ter agido bem.

Utilitarismo de Mill

John Stuart Mill
 John Stuart Mill foi um filósofo utilitarista, ou seja, um filósofo que acreditava que o maior bem da vida era a felicidade. A definição de felicidade para estes filósofos é:
  • A felicidade é o único bem com valor intrínseco e consiste no prazer e na ausência de dor.
 Mill desenvolveu uma teoria ética a partir do seu princípio da maior felicidade. Este princípio consiste em afirmar que as ações boas são aquelas que maximizam a felicidade, e as más aquelas que causam sofrimento. 
 Para Mill existem dois tipos de prazeres: os de ordem superior (de natureza intelectual), e os de ordem inferior (de natureza mais física). Mill defende que devemos preferir os prazeres superiores aos inferiores, argumentando que «[é] melhor ser um ser humano insatisfeito que um porco satisfeito; melhor ser um Sócrates insatisfeito que um tolo satisfeito; e, se o tolo ou o porco tem uma opinião distinta, é porque eles só conhecem o seu próprio lado da questão.»(2)
 Para que este sistema funcione, é necessário conhecer as consequências habituais de uma ação, ou seja, se fizermos uma determinada ação, temos que conseguir prever, na melhor das nossas capacidades, o que vai acontecer, de modo a maximizar a felicidade causada. 
 Utilizando o exemplo anteriormente dado, Mill não revelaria a localização de Albert, pois estaria a causar infelicidade a Albert e à sua família.


Críticas ao Utilitarismo

  1. Objeção do criminoso azarento ou do herói por acaso: Este contraargumento consiste em afirmar que, aceitando esta teoria, teríamos também de aceitar que alguém com más-intenções possa ter agido corretamente por azar seu. Por exemplo: «[S]e um assassino contratado falha o tiro e com isso fere um terrorista, assim impedindo que este detone uma bomba à distância que mataria dezenas de inocentes.»(3). Seria, neste caso, o assassino contratado um herói ou um criminoso à mesma?
  2. Males sem prejuízo: Ao contrário do que costumamos crer sobre os nossos deveres (e.g. honestidade e de honrar compromissos), o utilitarismo defende que uma ação sem más consequências não é considerada má. Por exemplo, se não cumprirmos uma promessa feita a alguém que não necessite já dela e já dela se tenha esquecido, seriamos considerados pelo utilitarismo como agentes neutros (nem bons nem maus). Porém, estaríamos a quebrar uma promessa à mesma, algo moralmente incorreto.
  3. Sacrifícios em nome do bem melhor: O utilitarismo diz-nos, diretamente, que podemos causar dores enormes a um indivíduo, desde que desta ação beneficiarem um maior número de indivíduos. Por exemplo, segundo o utilitarismo, é perfeitamente aceitável matar um sujeito para salvar a vida a dez. Tal posição é, hoje, amplamente rejeitada.
  4. A máquina do prazer: Esta objeção consiste em propor que, já que a felicidade é o bem supremo, muitos, senão todos, os indivíduos concordariam em viver ligados a uma máquina que lhes desse uma vida "virtual" recheada apenas de momentos de prazer e felicidade. Porém, quase ninguém parece aceitar esta proposta.
  5. Problemas no cálculo da utilidade: Estes problemas são levantados em dois pontos:
    1. Fazer um cálculo da utilidade presume que se consigam resumir todos os tipos de dores e satisfações, bem como a sua intensidade que, muitas vezes, varia de pessoa para pessoa, a uma escala numérica. Isto é algo altamente improvável de alguma vez conseguir ser realizado, senão mesmo impossível.
    2. Mesmo se este Adamastor de dificuldade fosse, de alguma forma, superado, teríamos ainda de prever as consequências, o que se torna extremamente difícil de fazer, especialmente quanto toca às consequências a longo prazo. 
     

Problema do carrinho (extra)

 Num artigo previamente publicado neste blog, falei sobre as éticas de Kant e de Mill, e apliquei-as a um famoso problema filosófico. Clica aqui para leres mais.

Exercícios 

1) A qual destas teorias da ética se aplicam as seguintes críticas?
A - Ética kantiana
B - Utilitarismo
  1. Males sem prejuízo
  2. Não resolve conflitos entre deveres
  3. A máquina do prazer
2 - Segundo Kant, um indivíduo que ajude os seus pais na cozinha em troca da sua mesada está a agir por dever ou conforme o dever?

3 - Completa a seguinte frase:
Segundo Mill, os prazeres de natureza intelectual são denominados de _______, enquanto os de natureza física são denominados de _______.

Resolução

 1) A - 2
     B - 1 3

2- Conforme o dever.

3 - superiores/inferiores

Notas

(1) - Retirado de: https://doxadep.blogspot.pt/2017/02/o-problema-do-carrinho-uma-analise-de.html
(2) - Retirado de: http://www.citador.pt/textos/antes-sabio-infeliz-que-tolo-feliz-john-stuart-mill
(3) - Pedro Galvão, António Correia Lopes: Preparação para o Exame Final Nacional Filosofia 11º ano, p. 57

Bibliografia

Pedro Galvão, António Correia Lopes: Preparação para o Exame Final Nacional Filosofia 11º ano
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/43/Immanuel_Kant_%28painted_portrait%29.jpg/800px-Immanuel_Kant_%28painted_portrait%29.jpg

https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/20/Bundesarchiv_Bild_183-H15390%2C_Berlin%2C_Kaserne_der_LSSAH%2C_Vergatterung.jpg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/9/99/John_Stuart_Mill_by_London_Stereoscopic_Company%2C_c1870.jpg/800px-John_Stuart_Mill_by_London_Stereoscopic_Company%2C_c1870.jpg
http://www.citador.pt/textos/antes-sabio-infeliz-que-tolo-feliz-john-stuart-mill
https://doxadep.blogspot.pt/2017/02/o-problema-do-carrinho-uma-analise-de.html

Guia compreensivo para o estudante: 10º ano, Ensino Regular - Aula ε

Valores

 Os valores são expressos através de juízos (A é B).
 É importante que se estabeleça a diferença entre juízos de facto e juízos de valor. Os juízos de facto são puramente descritivos, ou seja, seguem a fórmula A é B. Podem ou não coincidir com a realidade, ou seja, podem ser verdadeiros ou falsos. Tomemos com exemplo o seguinte juízo de facto:
  • O Boavista ganhou o campeonato pela última vez em 2000/2001.
 Este juízo de facto é, de facto, verdadeiro, mas não é isto que faz dele um juízo de facto. Igualmente, um juízo de facto pode ser falso e continuar a tratar-se de tal.
  • O Boavista ganhou o campeonato pela última vez em 2015/2016.
 O precedente juízo continua a ser um juízo de facto.

 Um juízo de valor é um juízo que atribui a algo um valor, quer seja positivo ou negativo, ético, estético, etc.
 Por exemplo:
  • Guernica é um quadro mais bonito que a Mona Lisa.
Guernica, Pablo Picasso
 Este juízo trata-se de um juízo de valor, pois trata-se da atribuição de um valor (ser um quadro mais bonito que a Mona Lisa) a algo (Guernica).

 Porém, podem-se exprimir valorações e preferências através de juízos de facto. Isto ocorre quando exprimimos um gosto, uma preferência, etc., na primeira pessoa. Por exemplo:
  • O meu quadro preferido é o Guernica.
 Aqui temos expresso um juízo de facto, pois estamos a exprimir uma preferência pessoal sobre determinado assunto (Guernica, neste caso), apesar de estarmos a atribuir valores estéticos.
 É convenção nestes casos assumir que a pessoa que faz o juízo está a dizer a verdade, visto que exprime juízos de facto sobre si mesmo.
 Existe também uma correlação entre os juízos de facto e os juízos de valor devido a esta aparente "irregularidade": Se alguém disser o juízo de facto "Penso que Sócrates agiu bem.", e tomar este juízo como verdadeiro, é implícito e obrigatório que aceite o juízo de valor "A ação de Sócrates foi boa." como verdadeiro.

Subjetivismo e objetivismo

 O subjetivismo defende que os valores de juízo são equivalentes a proposições de aprovação e desaprovação. Ou seja, defende que os juízos de valor e os juízos de facto são duas "entidades" distintas.
 Juntamente com o subjetivismo vêm associadas duas outras crenças: a relatividade e a historicidade.
 A relatividade defende que os valores são relativos a cada Homem, ou seja, para mim a escravatura pode não ser moralmente correcta, mas para o João pode ser.
 A historicidade defende que os valores vão mudando ao longo do percurso da História. Por exemplo, a escravatura era uma prática extremamente comum nos tempos de Sócrates, e era aprovada. Porém, actualmente, é extremamente reprovada pela maioria dos indivíduos.

 O objetivismo defende que os valores existem per si, ou seja, que os valores são algo completamente assente, e que são independentes do conhecimento humano. Defende assim que os juízos de facto e de valor não se distinguem verdadeiramente, pois os valores são, para os objetivistas, um facto do mundo, e um juízo de valor não passa de uma tentativa de descrever isso.
 Associados ao objetivismo vêm duas crenças, que se opõem às outras duas defendidas pelos subjetivistas: a absolutidade e a perenidade.
 A absolutidade defende que os valores são algo absoluto, e que não podem sofrer alterações.
 A perenidade defende que os valores são intemporais, e, por isso, não acompanham a História.
 Resumindo:


Posições filosóficas

 No 10ºano estudarás quatro posições filosóficas diferentes relativamente ao subjetivismo e o objetivismo; duas delas defendem o subjetivismo, e as outras duas o objetivismo.
 Vejamos:
  • Psicologismo e Emotivismo: Defendem o subjetivismo, devido ao facto de defenderem que os nossos sentimentos e opiniões pessoais definem os valores.
  • Naturalismo: Defende que os valores são uma qualidade intrínseca aos objetos. Ou seja, um livro é belo porque possui o valor de ser belo em si mesmo. Qualquer outra opinião está errada, pois este valor é objetivo e intrínseco ao livro. Defende, por isso, o objetivismo.
  • Ontologismo: Defende que os valores são ideias, ou seja, a expressão da racionalidade humana. Logo, são ideias que exprimem conceitos imateriais, e também inalteráveis e imutáveis. A defesa do objetivismo é diferente da defesa dos naturalistas pois os defensores do ontologismo afirmam que é a razão universal, algo comum a todos, que define e confere a objetividade. 
  Iremos agora distinguir o psicologismo do emotivismo:
  • Psicologismo: Os valores exprimem a natureza psico-comportamental do sujeito.
  • Emotivismo: Os valores exprimem as emoções e/ou sentimentos do sujeito.

 

Questões de primeira e segunda ordem

 Tomemos como exemplo a disciplina filosófica da estética, e o seguinte quadro:
At Eternity's Gate, Van Gogh
  • Questão de primeira ordem: Uma questão de primeira ordem é aquela que discute a preferência dos indivíduos A e B sobre o quadro, ou seja, é de primeira ordem a questão que coloca em cima da mesa juízos de valor (e.g. A: Gosto deste quadro, pois é belo. B: Não gosto deste quadro, pois não é belo.).
  • Questão de segunda ordem: Um questão é de segunda ordem se a questão colocada for sobre a natureza dos valores em si, e a sua objetividade/subjetividade. Neste caso, entramos no campo da metaestética (e.g. C: Será que este quadro possui intrinsecamente a propriedade de ser belo?).
 Com esta informação, podemos chegar à conclusão de que o subjetivismo e o objetivismo são ambos teorias de segunda ordem.

Argumentos a favor do subjetivismo

  1. Argumento da diversidade: Neste argumento defende-se que, simplesmente, os juízos de valor são extremamente diferentes de pessoa para pessoa (ou cultura para cultura).
  2. Argumento da estranheza de valores: Este argumento constata que, por exemplo, tal como para existir um copo têm que existir átomos, para que uma ação fosse objetivamente boa ou má (no caso da ética), os valores teriam de existir autonomamente e estarem presentes na ação. Tal parece-nos extremamente estranho, e como não temos indícios que tal exista, temos de aceitar o subjetivismo.
  3. Argumento da tolerância: Este argumento aplica-se à ética. Se estamos em dúvida se os valores são objetivos ou subjetivos, temos o dever de escolher a opção que cause menos confrontos entre diferentes culturas ou indivíduos, ou seja, o subjetivismo. 

Objeções a estes argumentos

  1. Um objetivista pode simplesmente constatar que a diversidade e divergência não são suficientes para negar que existe uma verdade absoluta. Lá porque existem pessoas que negam a existência de Deus e outras pessoas que afirmam a Sua existência não quer dizer que ambas as constatações estejam correctas, ou que Deus de facto não exista. Podemos apenas ainda não o saber.
  2. O objetivista pode argumentar da mesma maneira como argumentou no ponto 1: podemos simplesmente (ainda) desconhecer a existência autónoma destes valores.
  3. Uma objeção a esta linha de pensamento pode ser que, se aceitarmos o subjetivismo meramente por razões de tolerância, teremos também de aceitar e tolerar aqueles que não aceitam e toleram. Por exemplo, teríamos de aceitar alguém que acreditasse que matar os que não concordassem com ele em qualquer assunto (política, ética, estética, etc.) seria aceitável.

Argumentos a favor do objetivismo

  1. Argumento das consequências moralmente indesejáveis: Os objetivistas argumentam que, se aceitarmos o subjetivismo, teríamos de aceitar que linhas de pensamento moralmente reprováveis atualmente (e.g. as visões sobre a escravatura de antigamente, as visões sobre as "raças inferiores" dos nazis) não são nem mais nem menos corretas na nossa sociedade moderna. 
  2. Argumento da capacidade explicativa: Ao aceitar o subjetivismo, estamos a aceitar que não há um juízo de valor mais ou menos correto que outro, o que vai contra o que está profundamente enraizado em nós. Por exemplo, quando se discute a beleza do quadro Poker Game, existem certamente (para os objetivistas) maneiras melhores e piores de defender a beleza do quadro. Por exemplo, dizer que o detalhe é imenso será uma maneira certamente melhor de defender a beleza do que dizer que o quadro vendeu por mais de quinhentos mil dólares. Porém, se adotarmos um ponto de vista subjetivista, tal distinção desaparece, e as opiniões de especialistas, por exemplo, são uma perda de tempo.
  3. Poker Game
    Argumento da coincidência de valores: Neste argumento, o objetivista usa o argumento da diversidade contra o subjetivista, afirmando que existe uma enorme coincidência em valores morais e estéticos (embora com divergências, que se atribuem a erros e falta de formação e educação). Por exemplo, no campo da ética, virtualmente todas as sociedades modernas consideram reprovável a pedofilia e o homicídio. A melhor maneira de explicar isto é que estes valores existem objetivamente.
  4. Argumento do dissidente: Este argumento foca-se no relativismo cultural, e diz-nos que, visto que, segundo os subjetivistas, os valores, por exemplo, morais são o espelho da sociedade em que se encontram, como se explica que as sociedades mudem de valores? Afinal, os sujeitos teriam de considerar algo moralmente reprovável, dentro de uma sociedade em que esses valores se refletiam, algo que parece impossível de explicar usando o relativismo cultural.

Exercícios

1) Liga os seguintes termos à sua definição.
1 - Psicologismo
2 - Emotivismo
3 - Naturalismo

A - Os valores exprimem as emoções e/ou sentimentos do sujeito.
B - Os valores são uma qualidade intrínseca aos objetos.
C - Os valores exprimem a natureza psico-comportamental do sujeito.


2 - Completa a frase.
No objetivismo, os valores são ________.

3 - "Será que esta ação é eticamente correcta?» é uma questão de que ordem?


Resolução

1)
1 - C
2 - A
3 - B

2 - imutáveis

3 - Segunda ordem.

Referências

Pedro Galvão, António Correia Lopes: Preparação para o Exame Final Nacional Filosofia 11º ano
http://www.philosophy-dictionary.org/Axiological_subjectivism
http://sofos.wikidot.com/historicidade-perenidade
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/d/d2/Van_Gogh_-_Trauernder_alter_Mann.jpeg/800px-Van_Gogh_-_Trauernder_alter_Mann.jpeg
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/7/7a/Cassius_Marcellus_Coolidge_-_Poker_Game_%281894%29.png/1280px-Cassius_Marcellus_Coolidge_-_Poker_Game_%281894%29.png
https://static.significados.com.br/foto/guernica_bg.jpg