domingo, 22 de julho de 2018

Caderno de Tóquio, de Porfírio Silva



   Eu tenho de admitir algo. Eu tenho uma admiração muito profunda pelo país que é o Japão. Apesar de nunca ter visitado esta nação, o meu interesse surge desde muito jovem a partir de programas de desenhos animados de origem japonesa, tendo desenvolvido à medida que pesquisava na internet mais informação sobre o povo nipónico. 

   Recentemente, procurava encontrar alguma informação sobre filosofia feita no Japão. Algo básico chegava, queria apenas contextualizar-me sobre o assunto.

    Por sorte, foi-me recomendado por um vizinho o livro Caderno de Tóquio, de Porfírio Silva, um diário que relata algumas das experiências vividas por este filósofo português no território nipónico durante a sua estadia em trabalho entre maio e setembro de 2013.

SINOPSE
   Porfírio Silva procura escrever um diário que dissipe ideias feitas e tornar claro um Japão menos falado, mais sóbrio, que fuja às descrições feitas por guias de viajem.


O autor, Porfírio Silva
   Entre vários temas, é abordado principalmente:
  • O interesse dos japoneses pela robótica e a dimensão filosófica associada ao desenvolvimento desta área; 
  • Filosofia nipónica; 
  • As diferenças que os estrangeiros sentem nos primeiros dias da sua estadia, nomeadamente o civismo e a cortesia dos locais; 
  • A religião budista, xintoísta, e por vezes a hindu; 
  • Curiosidades sobre o património e cultura japonesa como o origami, o sumo e o teatro nacional;
  • Os diferentes sistemas políticos japoneses ao longo dos anos.

ANÁLISE E RECOMENDAÇÃO
   Sendo um livro que relata uma viagem, encontramos uma descrição informal dos acontecimentos, não existindo, no geral, uma sequência a seguir para a compreensão dos conceitos abordados.

    Em termos de informação, não é demasiado exaustivo nas descrições e mantém uma escrita fácil de compreender.

     Quanto à informação que procurava sobre filosofia japonesa, o autor descreve o pensamento deste povo como sendo muito relacionado às artes e à religião. Associado a isto, o grande desenvolvimento do pensamento filosófico dá-se com a restauração Meiji (aprox. séc. XX), quando o Japão tenta imitar as qualidades boas do ocidente. Portanto, o pensamento nipónico está a passar por uma fase de desenvolvimento, de busca de identidade.

   Dentro do livro, as secções que gostei mais são provavelmente as descrições do teatro Bunraku (uma espécie de teatro de fantoches) e a visita aos laboratórios de robótica em Osaka (no qual se produzem robôs com um aspeto muito próximo ao do ser humano), especialmente o primeiro, que explica detalhadamente todos os conceitos associados a este tipo de encenação, apoiando a explicação com imagens de maquetes e figuras do local onde se informou.

À esquerda, teatro Bunraku, e à direita, um exemplar de robôs humanóides desenvolvidos em Osaka
   Sabendo que se trata de um diário, não tenho propriamente críticas negativas a realizar.

   Portanto, recomendo a leitura deste livro, especialmente para pessoas com interesse no país do sol nascente.


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(Esta análise refere-se à 1ª edição, de abril 2015, da editora Esfera do Caos)

sábado, 3 de março de 2018

Uma Carta de Amor


Esta é uma carta de amor. Não vejo maior homenagem, do que a expressão (ou tentativa da mesma) do sentimento que flui através dos meus neurónios. A todas as caras que, nos meus meros e insignificantes dezasseis anos de existência, contemplei. A todos os elementos deslumbrantes da Natureza, que constroem perfeitas expressões a meus olhos. A todas as ondas de som que, magnificamente combinadas, chegaram aos meus ouvidos. A cada porção de ar que já inspirei, e devolvi posteriormente ao mundo que me rodeia. A cada átomo de oxigénio, nitrogénio, e carbono, presentes nessa minúscula porção. A cada composto de ácido desoxirribonucleico presente no meu ser, definindo precisamente a essência do que eu sou. A mim, e à humanidade que é tão, mas tão pequena. A cada objeto em que toquei, ou senti a ilusão de que toquei, porque na verdade, nunca o cheguei a fazer. Ao conhecimento que me concedeu a consciência disso. Ao ser único, diminuto, mas de complexidade sublime que foi capaz de me transmitir esse conhecimento, e a todos os que vieram antes dele. À leitura. A todo o conhecimento que perdura ainda por adquirir, e por todo o que assim permanecerá. A cada planta existente na superfície terrestre, e à junção de todas estas, permitindo a evolução como a conhecemos. A todos os oceanos. Ao aglomerado esférico de silicatos e metais onde a raça humana prosperou. À estrela fulgurante à volta da qual orbito, e à galáxia que a contém, juntamente com mais 100 mil milhões de outras. Ao colapso da estrela de que somos todos feitos. À crescente vastidão. Ao vazio. À beleza inimaginável de tudo o que já existiu, existe, ou alguma vez existirá.
Existem tantas estrelas no universo como o total de células existentes em todos os seres humanos do nosso planeta. Se uma só deu origem a tanto, o que mais poderá existir? Tantos mundos que chegaram ao fim, e tantos mundos à espera de ser criados. 

Esta é uma carta de amor ao Cosmos. Esta é uma carta de amor à ordem que compreende o meu caos. 



Esta é uma carta de amor à consciência. Eu estou aqui, agora. Eu estou viva. Nasci com a capacidade de pensar, e penso. Sinto cada arrepio alastrar-se pela superfície de tudo o que sou, e as lágrimas escorrerem-me pela face. Eu estou viva. Cresci na companhia de um sentimento imenso de vazio, de alienação e distanciamento perante a totalidade do que me rodeia, de uma falta de propósito, de um trilho encoberto. Esta é uma carta de amor à ciência, pois sem esta, nada seria eu. Esta é uma carta de amor à ciência, uma vez que esta me atingiu como um relâmpago atinge uma torre durante uma tempestade, e desta forma, acendeu uma vela no meu caminho. Este é um agradecimento, com a mais profunda sinceridade possível, à audácia de quem a estudou, e de quem a transmitiu por gerações incontáveis; pois sem a ciência, nunca poderia ter percebido, e aceitado o meu tamanho, a minha vivência, o meu lugar no vasto universo; que é, nada mais, nada menos do que o que eu fizer dele. Reconheço a sorte em estar viva. Apaixono-me pela mais pequena das partículas, e pelo conjunto de tudo o que estas concebem. Como poderia não? Nada provoca maior satisfação à minha pobre alma que a perceção de que somos todos e tudo descendentes de estrelas. À escala do cosmos, todas as questões e dilemas do quotidiano tornam-se desprezíveis. Nada disso importa na vastidão do universo, e isso traz-me uma serenidade colossal. Em contrapartida, os átomos que constroem as moléculas que formam cada ser humano, tiveram origem num pequeno ponto que se expandiu, originando tudo o que hoje conhecemos, e o que temos ainda por descobrir. De certa forma, somos gigantes, sistemas complexos de interações por sinapses. Cada um de nós alberga um universo dentro de si. Sinto uma sensação crescente de maravilha. Não existem palavras suficientes em todas as sete mil línguas humanas juntas para descrever e expressar o amor que eu sinto. Obrigada.
Ana Carolina Ribeiro, 10º A

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

BARBAS E BIGODES - II 'Cartesius', o filme


O filme «Descartes» (1974), de Roberto Rossellini (legendado).



Série: BARBAS E BIGODES - I Peter Singer (fala sobre) Hegel e Marx



Porque um grupo de alunas de Filosofia A escolheu a Ética Prática de Peter Singer.

Porque Hegel e Marx são assunto recorrente nas aulas de Filosofia A.

Porque, na aula de hoje o Rafael Moura disse que a Filosofia é «um grupo de homens barbudos a dizerem que o que o outro disse está mal».


Eis o número I da série filosófica: Barbas e Bigodes!



O Leão sem Juba - Volume II - A Inevitabilidade da Morte, a Fraca Condição Humana, e como tudo isto nos pode ajudar a ajudar.

Introdução

 O Leão sem Juba é uma coleção de vários ensaios meus focados nos mais diversos temas. Deixo aqui o link para o download do segundo volume, que trata das temáticas da morte e do suicídio. Este ensaio está repleto de influências de Emil Cioran. Deixo abaixo não só o link, como também um conjunto de citações oriundas deste ensaio que espero que "abra o apetite" ao leitor.

Citações

"Todos nós nos matamos um pouco diariamente.
Quer seja o fumador, que encurta a sua vida, o condutor que conduz acima do limite de velocidade, ou o suicida de acordo com a nomenclatura, todos nos atrevemos a tomar riscos que podem resultar na chegada da foice para nos colher deste mundo mais cedo. Mas continuamos a ter medo da morte. Uns mais que outros, certamente, mas todos duvidamos do nosso lugar neste mundo a um determinado momento da nossa vida. E é nesse momento, paradoxalmente, que vivemos a vida mais feliz de todas as possíveis. De repente, apercebemo-nos da verdade: Somos insignificantes sozinhos ou em pequenos grupos."

"O sentimento que associamos à morte de alguém chegado, aos mortos de um atentado em país x, etc., só mostram a natureza do Homem transformado e transfigurado pela sociedade: "o que eu vejo, dói-me, mas o que não vejo mas sei, não me afeta."."

"Chorar porque um dia iremos morrer é inútil. É como chorar porque teremos que, futuramente, fazer qualquer ação básica e mundana. De facto, esta é uma coneção interessante: o mundano interlaça-se com o espiritual e o inevitável. Como seres racionais que somos, é fácil para nós nos apercebermos o quão ridícula esta situação é."

Link

Clique aqui.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Dados para reflexão: comparar o comparável


Comparar o comparável – Montijo e Alcochete nos Rankings do ES (2017)




O problema não é a divulgação dos 'rankings'. É as leituras que se fazem da informação que disponibilizam, que generaliza o parcial e compara o incomparável. Mas comparar o comparável é legítimo e útil. A minha escola (ESA) em contraponto com as suas mais próximas e semelhantes, a escassos quilómetros e num contexto socio-económico e cultural semelhante.


GERAL


Escola Secundária de Alcochete
E.S. Jorge Peixinho Montijo
E.S. Poeta Joaquim Serra Montijo
Ranking de Exames
224
292
505
Ranking de Sucesso
74
347
171
Média Exames
10.8
10.5
9.09
Média Interna
13.8
13.4
13.3
Promoção do Sucesso Escolar
40%
34%
26%



Disciplinas isoladas (3 exemplos):


Escola Secundária de Alcochete
E.S. Jorge Peixinho Montijo
E.S. Poeta Joaquim Serra Montijo
FILOSOFIA
82
(Média de exame: 12,51)
264
(Média de exame: 10,59)
309
(Média de exame: 10,16)
MATEMÁTICA A
244
(Média de exame: 11,44)
258
(Média de exame: 11,31)
412
(Média de exame: 10,0)
FÍSICA E QUÍMICA
175
(Média de exame: 10,30)
371
(Média de exame: 8,91)
461
(Média de exame: 7,98)



A Filosofia na ESA dá «cartas»!!

sábado, 13 de janeiro de 2018

Filosofia Explicada: A Criação de Mais-Valia - Karl Marx

Introdução

 Karl Marx foi um filósofo, economista, historiador, sociologista, teórico político, jornalista e revolucionário socialista.
 A sua obra é das mais influentes, tanto a nível filosófico, como a nível político-económico, tendo como obras mais conhecidas O Manifesto do Partido Comunista, e o seu magnum opus, O Capital.
 N'O Capital, Marx faz críticas à sociedade capitalista, especialmente ao modo de produção capitalista e ao seu desrespeito pelos trabalhadores e pelo seu produto.
A mais-valia é um termo Marxista para descrever o que chamamos de lucro. No presente artigo iremos ver como Marx diz que se origina a mais-valia.
  

A Mais-Valia

 (Nota: Os valores aqui utilizados são meramente ilustrativos, e aproximados aos que Marx diz n'O Capital. Foram também mudados os nomes de francos para euros, com o objetivo de melhor compreensão.)
 Investigaremos o processo de produção de um casaco, para o qual necessitamos de um quilo de linha.
 Marx começa por nos dizer que o preço pelo qual o capitalista adquire uma matéria prima x, com o objetivo de o transformar, por meios de indústria, em produto y, será idêntico ao valor de produto y, após o processo industrial. Ou seja, se o capitalista adquirir dez quilos de algodão por dez euros, e obter desses dez quilos um total de dez quilos de linha, o valor dessa quantidade de linha continuará a ser de dez euros, inicialmente.
 De seguida, vem o valor do conjunto de máquinas necessários para a produção de linha. O exemplo dado por Marx é o de fusos necessários para a transformação do algodão em linha.
 Marx diz ainda que se o capitalista optar por usar, por exemplo, fusos feitos de ouro, e não de ferro, apenas se acrescenta o valor que se pagaria pelos fusos de ferro, visto que este é o valor correspondente ao tempo socialmente necessário para produzir o produto final. Explicando isto melhor: Marx diz que usar fusos de ferro serviria perfeitamente para produzir produto y, logo, a utilização de fusos de ouro trata-se de uma opção, e não de algo necessário. O valor extra que o capitalista paga pelos fusos de ouro não tem, na verdade, impacto verdadeiro sobre o produto. Isto deve-se ao tempo de produção dos fusos, que ocorre em paralelo, noutra fábrica e através da mão-de-obra de outros trabalhadores, ser inferior, mas produzir exatamente o mesmo resultado. Por isto, o tempo socialmente necessário influencia o valor, estabelecendo sempre o valor "real" de dito produto o mais baixo possível.
 Entram então os trabalhadores. Imaginemos que o trabalhador é pago três euros por dia, e num tempo total de seis horas consegue capital suficiente para viver. Ora, se numa hora de trabalho, o operário transformar 1.75 quilos de algodão em 1.75 quilos de fio, temos que em dez horas conseguirá transformar os dez quilos de algodão em dez quilos de fio totalmente.
 Se tomarmos que os fusos custaram ao capitalista dois euros e o algodão comprado equivale a um dia de trabalho (6 horas, neste caso), temos:
 10 (valor do algodão que já inclui o tempo de trabalho) + 2 (preço dos fusos) + 3 (salário pago aos operários e valor socialmente necessário) = 15.
 E que:
 10 (valor do fio) + 2 (preço dos fusos) + 3 (salário pago aos operários e valor socialmente necessário) = 15.
 Isto significa que o capitalista não consegue lucro absolutamente nenhum com o processo industrial!
 Ora, segundo Marx, o que o capitalista faz é algo simples: Aproveita-se do facto do operário só necessitar dos três euros diários (que ganha ao longo de seis horas), e fá-lo trabalhar, por exemplo, doze horas pelo mesmo valor.
 É através deste processo que os capitalistas geram a mais-valia.

Fonte:

MARX, Karl, O Capital Edição Popular, Edições 70